congelar o tempo

Raramente fico com aquela sensação de que deveria ter dado mais valor a alguém ou que penso "devia ter aproveitado mais tempo para estar com esta pessoa". De vez em quanto faço asneira e por vezes mudo e os outros também, o que nos leva a distanciarmos-nos de quem foi importante, mas todos os dias fico feliz pelas pessoas que conheci e pelas que tenho ao meu lado. Não estou constantemente a declarar um "gosto muito de ti" ou a dizer obrigado por "cada momento", mas sinto-me de facto agradecida por pelas pessoas que vou conhecendo e que vão ficando. Estou grata pelo irmão que tenho. Pelo meu namorado. Pelas minhas "gordas", os dois melhores amigos que encontrei na faculdade. E por outras quantas pessoas de quem não sou tão próxima, mas de quem gosto muito porque me fazem rir e me deixam à vontade para ser a Maria Tosca que sou. 

Não gosto de ler nem de ouvir "poucos mas bons" no que diz respeito aos amigos ou pessoas próximas, porque fico sempre com a sensação que se estão a justificar por não terem uma multidão de pessoas à sua volta. Acho que o objectivo deve ser mais "ter por perto os que são bons", porque de outra forma, para quê perder tempo com pessoas de quem não gostamos? Não percebo porquê de, mesmo quando parece que estão a ligar à qualidade, vêm com o "poucos" mais uma vez a quantificar. 

Isto tudo para dizer que, mais uma vez, sei como as coisas vão mudar este ano. Foi assim do secundário para a faculdade, vai ser assim da faculdade para o resto da vida. Mas se houvesse uma maneira de congelar alguns dias ou algumas rotinas das quais sinto saudades ou sei à partida que vou sentir a falta de forma a puder voltar a esses dias de vez em quando, congelaria quatro.

A primeira rotina a voltar seriam as brincadeiras com os meus primos durante o verão quando éramos miúdos. Qualquer dia em que fizéssemos casas na areia, houvessem idas à piscina, voltas de bicicleta, jogos de escondidas e o quarto escuro.

A segunda seria a rotina de ir para a escola no 9ºano, com o meu irmão a bater a porta de casa, não sem antes gritar "vais perder o autocarro!", coisa que só não acontecia porque o motorista era uma jóia e esperava por mim. Qualquer dia em que entrasse no autocarro rumo à minha escola preferida, com um lugar guardado pelas minhas amigas, qualquer dia em que fossemos ao café antes das aulas e depois fizéssemos tempo a jogar ping-pong até a campainha tocar, qualquer dia que passasse naquela escola e voltasse de novo no mesmo autocarro ao final da tarde, era um bom dia para viver outra vez.

O terceiro dia que ao qual gostava de voltar, de maneira simples, seria o dia em que dei uma cabeçada ao meu namorado ao tentar beijá-lo pela primeira vez.

A quarta e a última rotina seriam as viagens de ida e volta da faculdade com os meus amigos. Seja de comboio ou às vezes de carro, os melhores tempos que passei com eles foram durante estas viagens de cerca de uma hora. Foi durante as mesmas que passámos de estranhos a amigos. É quando venho apenas com um deles que falamos de coisas mais sérias, e é também nestas viagens que importunamos as outras pessoas rindo muito alto e sem razão aparente. Ainda existem umas quantas viagens até ao final, mas não me imagino alguma vez a fazê-las sem ter saudades dos meus dois colegas e do tempo em que estavamos juntos todos os dias. 

Era tudo isto que eu congelava para voltar outra vez. 

1 comentário:

  1. A nossa lingua materna não se esquece :) podemos esquecer certas palavras... isso acontece-me principalmente com coisas do trabalho porque são situações muito especificas e técnicas mas de resto, sabe tão bem falar português :)

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